Saúde emocional: procura-se alguém para conversar

Saúde emocional

A maioria das pessoas com transtornos mentais não está recebendo um tratamento adequado – por falta de recursos. Chatbots poderiam ajudar aumentar o acesso ao cuidado de saúde mental e o bem-estar emocional da população geral.

Por Ines Hungerbühler

“Olá, como você está se sentindo hoje?” “Estou acelerada”, respondo. “Entendi. Vou te guiar através de um exercício bem simples que vai acalmar a sua mente e recuperar o seu foco, topa?”

Não, não estou deitada no sofá de um terapeuta, estou no metrô, indo pro trabalho, “falando” com meu celular.

Eu não sou o tipo de pessoa que facilmente admite que está com um problema e que talvez estou precisando de ajuda (profissional). Mas, estava me sentindo bastante ansioso e acelerado nas últimas semanas. Daí descobri aquele chatbot que oferece apoio emocional e monitoramento de aspectos emocionais (como ansiedade ou estresse).

Ao longo do último mês falando com o bot aprendi várias técnicas que me ajudam passar por momentos difíceis, estou me conhecendo cada dia melhor e descobrindo o que me faz sentir bem. Acho bem legal essa jornada!

Epidemia de ansiedade e depressão

“Brasil sofre com epidemia de ansiedade e depressão”. É verdade. De acordo com relatório divulgado em fevereiro de 2017 pela Organização Mundial da Saúde (OMS) são 18,6 milhões brasileiros diagnosticados com ansiedade e 11,5 milhões com depressão. A dimensão deste problema é ainda muito maior, pois estes números não incluem todas as pessoas que não estão diagnosticadas ou que apresentam um quadro subclínico (uma manifestação menos grave).

A ansiedade faz parte da nossa vida e pode ser considerada uma reação normal do nosso corpo diante de situações que podem representar uma ameaça. Só que, quando estamos nos sentindo constantemente ameaçados ou passamos por momentos de ansiedade extremamente intensos, essa sensação virou uma doença mental.

O caso da depressão é bem parecido. A tristeza é um sentimento considerado saudável e importante, pois ajuda na elaboração das perdas, ou sofrimentos ocasionais. Porém, se a tristeza não passa depois de um tempo e começam a surgir sentimentos de apatia, indiferença, desesperança, falta de perspectivas ou prazer pela vida. Você poderia estar sofrendo de depressão. Isso não é um estado de tristeza profunda, de desânimo, preguiça, estresse ou mau humor. A depressão é algo bastante diferente: é uma doença como outra qualquer que exige tratamento.

Lacuna assistencial no atendimento a pessoas com transtornos mentais

Só que muitas vezes os que mais precisam não estão recebendo tratamento. O Atlas de Saúde Mental 2017 da OMS revelou que, em países de baixa renda, existem dois profissionais de saúde mental por cada 100 mil habitantes. Em comparação com mais de 70 profissionais em países de alta renda. Isso está em alto contraste com as necessidades existentes. Estima-se que uma em cada 10 pessoas precisa de cuidados de saúde mental em algum momento da vida.

Consequentemente, a maioria das pessoas que sofrem de algum problema mental não está recebendo um tratamento adequado. Um levantamento em 2012 mostrou que em São Paulo 53% das pessoas afetadas não estão sendo tratadas [1]. Em regiões mais rurais do país, essa taxa deve ser ainda maior.

O que podemos oferecer, baseado em que terapeutas e médicos, aparentemente não é o suficiente para tratar todas pessoas com doenças mentais adequadamente?

Novas tecnologias, novas oportunidades

Com a presença da internet na sociedade surgiram novas oportunidades na prestação de cuidado em saúde mental. Dispositivos móveis como telefones celulares, smartphones e tablets, por exemplo, estão permitindo ao público, médicos e pesquisadores novas formas de acessar ajuda, monitorar o progresso e aumentar a compreensão do bem-estar mental.

A assistência de máquinas (programas, softwares, plataformas, novas tecnologias de comunicação, etc.) pode ser uma ajuda muito bem-vinda na saúde mental. Afinal, é um campo onde os problemas são subdiagnosticados e subtratados.

Enfrentando esse desafio, a TNH Health está lançando um programa de saúde emocional usando a tecnologia de chatbot que se dirige a questões de saúde mental e bem-estar emocional.

Chatbots são programas de computador que usam inteligência artificial para se comunicar com os humanos. Eles simulam a fala humana e dão respostas amigáveis usando o processamento de linguagem natural (NLP) e aprendizagem de máquinas. Com isso, eles têm um alto potencial de abordar a falta de profissionais de saúde mental.

É claro, ainda precisa-se de um profissional de saúde humano para estabelecer um diagnóstico ou para tratar quadros de doenças mentais mais graves. Bots ainda (ou nunca?) não podem substituir completamente terapeutas reais. Mas, bots podem apoiar uma pessoa em cuidar do seu bem-estar emocional. Podem também dar suporte para passar por um momento difícil (entre as sessões de terapia, ou, sobretudo entre pessoas que não estão recebendo nenhuma ajuda profissional). São um recurso sempre disponível – o que não é (e não deveria ser) o caso com os profissionais de saúde mental.

O terapeuta em seu bolso

No começo deste blog há uma interação de um usuário que está monitorando a ansiedade e o estresse dele com a ajuda de um chatbot. Este usuário não tem um diagnóstico de ansiedade, mas está passando por uma fase difícil na vida dele. Com o apoio dessa tecnologia provavelmente vai poder evitar o desenvolvimento de um quadro clínico. Isso se chama tratamento precoce. Ou, neste caso, cuidar da saúde emocional para evitar o surgimento de doenças mentais.

A prevenção de uma doença é obviamente uma das formas mais eficazes de reduzir a carga que ela causa. Inclusive, diminui os custos diretos e indiretos, tanto para a pessoa (e a família) afetada quanto para o ambiente (trabalho e sociedade) dela. Prevenir doenças mentais significa cuidar do bem-estar emocional e da saúde mental das pessoas. Existem evidências científicas que intervenções baseadas na Internet e em dispositivos móveis podem ser eficazes na prevenção de transtornos mentais [2].

Apesar de não poder substituir o calor humano, o bot tem algumas vantagens que podem compensar isso. Ele é neutro. Não julga (porque não tem valores morais, o que, neste caso, pode ser considerado como algo positivo). É conveniente (você não precisa se deslocar e está disponível em qualquer horário). Sempre respeita totalmente sua privacidade.

Além disso, os bot podem incentivar pessoas a procurar tratamento mais cedo, identificando riscos ou sinais precoces de perturbações mentais. Ou seja, tecnologias como os bots podem ajudar aos profissionais de saúde mental a trabalhar de forma mais eficiente.

A manutenção do bem-estar emocional para prevenir doenças mentais é uma coisa. O outro desafio em que os bots podem nos ajudar é no monitoramento de pessoas com transtornos mentais já diagnosticados. Assim, é possível monitorar o progresso do tratamento e melhorar a qualidade de vida das pessoas afetadas.

Por último: investir em saúde mental não é bom apenas para a saúde, mas também para a economia. Cada US$ 1 investido no tratamento para transtornos mentais comuns, como depressão e ansiedade, resulta em um retorno de US$ 4 em melhores condições de saúde e capacidade de trabalho. 

Referências

¹https://www.paho.org/bra/index.php?option=com_content&view=article&id=5354:aumenta-o-numero-de-pessoas-com-depressao-no-mundo&Itemid=839

²http://www.who.int/mental_health/evidence/atlas/mental_health_atlas_2017/en/

[1] Andrade LH, Wang YP, Andreoni S, Silveira CM, Alexandrino-Silva C, et al. (2012) Mental Disorders in Megacities: Findings from the São Paulo Megacity Mental Health Survey, Brazil. PLOS ONE 7(2): e31879. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0031879

[2] Ebert, D. D., Cuijpers, P., Muñoz, R. F., & Baumeister, H. (2017). Prevention of Mental Health Disorders Using Internet- and Mobile-Based Interventions: A Narrative Review and Recommendations for Future Research. Frontiers in Psychiatry, 8, 116. http://doi.org/10.3389/fpsyt.2017.00116

Ines Hungerbühler é consultora clínica senior da TNH Health                                                           linkedin: https://www.linkedin.com/in/ineshungerbuehler/

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